Ela pediu um pão francês. Os mais mal assados que tivesse. O olho estava ainda cheio de uma remela de ontem, meio dura. Dava ao olho um ar oriental que lhe caía bem.
O funcionário sorriu. Na verdade, já sorria previamente. Pegou o pão sorrindo. Sorriu para o saco de papel pardo. Entregou a moça e, ainda com um escancaramento de dentes entregou a comanda.
Ela foi até o caixa. Passou por um senhor, que também sorria. Para a prateleira, para o pacote de miojo. E agora, para ela.
A moça desvia. E vai pagar seu pão. O homem do caixa olhava para a rua, com um olhar perdido. Observando os carros de placas de outras cidades. Se imaginando como alguém que cada dia está num lugar diferente, que podia jogar tudo pro ar a qualquer instante. Seu dentes a mostra eram tão amarelo-acinzentado quanto seu acento branco, marcado pelos 34 anos em que se sentou ali.
Ela pagou e foi embora. Atravessou a rua na faixa. Um grupo de moradores de rua sorriam para ela, atrás de um carrinho de recolhimento de sucata.
Um rádio anunciava, dentro do carrinho: "Surto de lepra em Belo Horizonte, arrastão generalizado no Espírito Santo, Bahia se torna um estado independente, a Amazônia termina de ser asfaltada, expectativa de vida sobe para 35 anos".
Ela caminha pouco e chega até sua casa. A sua casa de hoje. Escolheu uma bonita viela, escura, mas com trepadeiras nas paredes. Se sentou e mordeu seu pão. Enrolou-se com sua cobertura. Pegou seu espelho.
Sorria. Com um desespero que rasgados qualquer mandíbula desacostumada. Seus dentes diziam sim, SIM! A tudo que houvesse, a tudo que pudesse, a qualquer farelo que aparecesse.
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Vou ler mais vezes.
ResponderExcluirSorrir quase sempre é ridículo.
ResponderExcluirDente tá bom um só para abrir a garrafa de cerveja.
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