terça-feira, 11 de janeiro de 2022

anomalia

Alguns acontecimentos tem tal carga que a gente sabe, instintivamente, que a partir dali, não existe retorno. (Essa não parece uma afirmação que faça sentido e talvez realmente não tenha. E por isso mesmo, nesse contexto, essa variável tenha mais chances de ser verdadeira). O futuro está coberto por aquele pano escuro, com certa transparência, que só em alguns momentos de reflexão profunda ou de identificação de padrões conseguimos antever. Não sei se no exato momento me incluo em alguma das duas situações. Mas essa falta de retorno talvez eu possa chamar de conhecimento. Quando você percebe algo de uma forma que não pode ser desfeita. Alguém que não sabe ler e aprende a ler, nunca mais vai interpretrar o mundo como anteriormente. Quem sentiu água encharcando o corpo em um dia muito quente, não pode se livrar dessa sensação. Quem conseguiu preparar sua primeira refeição, sabe que é capaz de se alimentar sozinho. Sabe que é capaz. Como se, no tabuleiro da vida, você promovesse uma nova peça, que pode ser usada no jogo (e sacrificada?). Não sei até que ponto todo o meu apreço pela razão e pela ciência pode conter uma, talvez, pré-disposição para uma anomalia, que encontrou no plano cartesiano de dias e horas o seu momento de vir à tona e se mostrar capaz, após anos de aviso de que estava ali. 

Eu olho para ela com horror, porque é realmente monstruosa; mas também com familiaridade. E aquela pergunta que toda pessoa em sua sombra já se fez "quem sou eu?" volta como uma bigorna acertando minha cabeça. Mas tem agora um teor muito mais específico. Agora a questão olha a anomalia e pergunta se somos a mesma pessoa. Ou se é um lado meu, um instinto, uma circunstância. E esse momento vai se colando a outros, tentando formar uma parede de detetive, formando rotas e associações. E concluindo com estranheza que só agora realmente pareceu algo alarmante. Antes não era? Talvez essa noção tão tardia é que sublinhe a gravidade da coisa. 

afinal, o que é isso que mora aqui, nessa tela preta?

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